quinta-feira, 10 de maio de 2012

Um pouco de mim!


Eu sempre me senti muito sozinha. Na infância cercada de gente me paparicando eu sentia que era preterida, que as pessoas gostavam menos de mim do que das outras crianças. Achava que meus pais preferiam minhas irmãs. Os meus avós eu julgava que preferiam meus primos e eu me considerava sozinha. 

Na adolescência a coisa foi piorando por que mesmo cercada de grandes amigos e amigas, que tenho até hoje, eu me sentia sozinha, isolada. Não entendia o porque. Em épocas eu julgava que as pessoas se afastavam de mim por que eu era feia. Em outras épocas eu achava que era por que nossos interesses não eram compatíveis, já que esta época eu fugia dos meus medos e dos meus questionamentos me enfiando em leituras.  E por isso sentia uma falta imensa de pessoas com quem eu pudesse “trocar figurinhas” sobre as obras de Érico Veríssimo, Machado de Assis e Agatha Christie, Sidney Sheldon, Jorge Amado e Eça de Queiroz, que eram os meus “preferidos” aos quinze anos.

Acho que era uma pessoa estranha que oscilava entre a necessidade gritante de ser popular e de uma ânsia agonizante de ter conhecimento. E eu sofria nesse conflito e não percebia que eu estava cercada de pessoas que me amavam pelo que eu era e que me admiravam pela minha busca de conhecimento e pela dedicação aos amigos. 

Era uma oscilação em polos tão distintos que hoje eu analiso e me assusto. Queria incessantemente ser como a Sandy, linda meiga, querida e admirada. Mas, em contrapartida, eu era apaixonada por Hilda Furacão, personagem principal de uma obra literária que virou minisserie de TV e que foi interpretada por Ana Paula Arósio. Queria a força, a determinação e no fundo a admiração que todos, mesmo os que detestavam Hilda Furacão, tinham pela personagem.

No ensino médio me cerquei de quatro ou cinco amigos, na verdade grandes amigos. Achava que as outras pessoas não tinham o QI equivalente ao nosso, que não tinham a nossa simpatia e nem o nosso bom gosto para as roupas. Afinal, estava deixando de lado a menina meiga que chorava por ser se sentir excluída para ser uma pessoa um pouquinho mais forte e mais dura. 

Na época da faculdade criei uma espécie de rejeição ao estereótipo que fizeram dos alunos do meu curso. Tudo que eu não queria era ser como eles. No fundo eu entendo que não queria ficar no meio deles e me sentir apagada, como mais uma entre tantos. Não queria ser militante de esquerda, não queria recitar Karl Marx, não queria subir a serra e ir passar finais de semana em festas alternativas em Taquaruçú. Não conseguia me ver uma “riponga”.

Por isso construí amizade e relacionamentos fora desse circulo. Na faculdade eu era amiga dos meninos e das meninas na Engenharia Ambiental, que na época não era curso de ripongas, a ponto de algumas pessoas acharem que eu fizesse este curso. Considerada por professores e por profissionais  como uma pessoa talentosa eu sofria ao ver trabalhos ruins sendo desenvolvidos, profissionais medíocres sendo ovacionados e, principalmente, em ver a falsidade imperar. Queria muito mudar isso. 

Me formei cheguei ao mercado de trabalho cheia de gás e de ideias novas. Passei por agencias, produtoras, redações, assessorias, escritórios de eventos e percebi que a mesma inquietude da minha infância continuava dentro de mim. A insegurança de não ser aceita, o medo da rejeição, o medo de se taxada de feia ou de burra, um medo gigantesco de ficar sozinha, isolada. E, por causa desse medo me isolei diversas vezes. Me escondi. Evitei rodas sociais, confraternizações. Construía relações profissionais, com medo de abrir a guarda e permitir que relações pessoas me magoassem ou que descobrissem que não era exatamente como a máscara que eu mostrava.

Criei uma arredoma, um campo de força onde apenas as pessoas que eu julgava com merecimento podiam entrar e conhecer a verdadeira Fernanda.  E era inevitável que as pessoas de fora questionassem os frequentadores da arredoma como era possível  conviver com a pessoa insensível, dura e rude que estava fora do campo de força.

Nessa época eu acreditava que se eu me tornasse totalmente fria e sem sentimentos, uma espécie de “Dama de Ferro”, seria mais fácil ser feliz. Um grande engano. Sofri demais com isso. Como toda escorpiana sou possessiva e obstinada e cuido do que é meu. Isso inclui meus amigos. Demorei a entender que o fato deles serem meus amigos não os impedia de ser amigos de outras pessoas e nem os obrigava a ter que concordar com tudo o que eu pensava.  Na verdade, hoje eu tenho certeza que meus melhores amigos são aqueles que sempre tiveram coragem de me falar de peito aberto e sorriso no rosto que eu estava errada e que eu não me conhecia o suficiente para saber o que eu queria  da vida.

Quantas vezes me disseram “saia da Terra do Nunca. Tire a armadura. A vida é mais fácil e mais gostosa do que essa guerra que você trava diariamente entre as duas pessoas que você vive. Você e o seu personagem”. Demorei a entender o verdadeiro significado disso.  Precisei encontrar uma pessoa com que me identifiquei demais e que me vejo nela há 10 anos para entender o que me diziam.

Com cinco anos a menos que eu, uma amiga, que já é extremamente especial, repete os mesmos erros e me faz voltar a situações praticamente idênticas as vividas por mim e me faz repensar em todos os meus conceitos. Nessa revisão de valores percebi que tive a melhor infância do mundo. Com pais amorosos,atenciosos e dedicados. Com duas irmãs meigas, lindas e determinadas e com amigos que amam ao ponto de suportar junto comigo todas as crises que vive até hoje.

Percebi também o quanto magoei algumas pessoas na adolescência e o quanto eu fui cruel e injusta comigo, quando exijo muito mais que a perfeição nos meus atos e nas minhas ações. Percebi que fiz pessoas sofrer, mas que além disso me fiz sofrer. Doeu muito, mas resolvi sair da minha arredoma do mundo perfeito e abri a porta para a vida de verdade. E nesse mundo real to descobrindo que sou muito mais especial do que imaginava, por que tenho pessoas fantásticas perto de mim.

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